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Pelé, 75 anos, a majestade inconteste

No dia do aniversário de Edson Arantes do Nascimento, confira dez fotos icônicas — comentadas pelo próprio Rei — que narram a construção do mito e ilustram os tempos de ouro da seleção brasileira


Pelé
Pelé VEJA

Em dez fotografias, o mesmo número de sua lendária camisa, o maior jogador da história do futebol empreende para VEJA um passeio pela memória dos melhores anos da seleção brasileira, quando, em quatro Copas, de 1958 a 1970, a equipe de camisa amarela conquistou três títulos mundiais e se inscreveu na galeria dos grandes mitos esportivos de todos os tempos. Pelé foi o único jogador presente em todas aquelas batalhas e o maior símbolo de um Brasil vencedor.

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Em VEJA de 4/3/2009:

“É bom ser exemplo”, diz Pelé

As cenas escolhidas pelo rei do futebol reconstroem os anos que tornaram a camisa verde e amarela sinônimo do melhor futebol do planeta, mistura de arte, força, habilidade, invenção e competitividade. Um tempo que o mundo relembra como mítico. Em poucas palavras: a era Pelé.

GUIA DA COPA - PELE 02
GUIA DA COPA – PELE 02 VEJA

​Campeão em seu primeiro Mundial, quando tinha 17 anos, Pelé garante que não se sentiu cobrado: “Foi tudo muito rápido, um sonho”. O peso de ser a estrela da companhia veio depois, à medida que as atuações de gala no Santos e na seleção consolidavam seu nome como marca de alcance mundial. Uma marca tão poderosa que o próprio homem que a encarnava, o mineiro Edson, passou a se referir ao supercraque na terceira pessoa. “O Pelé tinha uma impulsão danada”, afirma, olhos brilhando, diante da foto de seu gol de cabeça contra a Itália na final de 1970, o primeiro da vitória de 4 a 1 que deu ao Brasil o tricampeonato. “O pessoal esquece porque na época não havia televisão.”

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Trata-se de uma meia verdade. A transformação de Pelé num fenômeno provavelmente insuperável – o homem que, em vez de quinze minutos, terá “quinze séculos de fama”, segundo Andy Warhol – deve-se tanto ao seu gênio quanto à difusão cada vez maior do futebol via TV e às lutas pelos direitos civis dos negros que a sociedade americana exportava para o mundo, processos amadurecidos junto com sua carreira. “Mas naquela época apagavam os videoteipes, gravavam por cima”, lamenta. O que não havia mesmo nos anos 1960 era a cobertura exaustiva dos últimos tempos, à qual ele atribui as contestações à sua majestade.

É evidente que as comparações que o perseguem há décadas – em especial com Maradona, mas hoje também com Messi – machucam o Rei. Sobretudo quando partem de seus compatriotas, numa rejeição que parece ter menos a ver com futebol do que com o espírito naturalmente conciliador e o conservadorismo que marcam suas atuações fora de campo. Sem que o interlocutor toque no assunto, o único jogador a ganhar três Copas do Mundo e a marcar 1 283 gols se defende: “Sou brasileiro! Maradona e Messi só chutam de esquerda”.

É desnecessário recorrer ao patriotismo. Antes de morrer, em 2006, o húngaro Ferenc Puskas, líder da lendária seleção húngara de 1954, teve tempo de votar no melhor jogador da história. Escolheu o argentino Di Stéfano e explicou: “Recuso-me a classificar Pelé como jogador. Ele estava acima disso”.

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SUÉCIA, 1958

GUIA DA COPA - PELE 03
GUIA DA COPA – PELE 03 VEJA

“Quando marquei o último gol da final contra a Suécia, fiquei zonzo do choque de cabeça com o beque. Como o juiz apitou o fim do jogo, pensei: ‘Vou ficar um pouco por aqui’. Aí veio o Garrincha me levantar, e eu não parei mais de chorar. Só pensava uma coisa: será que a minha família sabia que éramos campeões? Na época não tinha televisão, telefonar era difícil. Hoje o cara mete um gol e diz: ‘Beijo, mãe!’. Só no dia seguinte eu falei com meus pais pelo rádio. Sempre me perguntam como, aos 17 anos, eu aguentei a pressão, a responsabilidade de ganhar a Copa. Mas a responsabilidade era do Didi, do Vavá, do Gilmar… Aquilo para mim foi um sonho. Agradecia a Deus por estar lá.”

CHILE, 1962

GUIA DA COPA - PELE 05
GUIA DA COPA – PELE 05 VEJA

“É engraçado. Claro que 1962 foi um momento pessoal triste: eu tinha feito um gol no primeiro jogo contra o México, mas senti uma distensão na coxa na partida seguinte, contra a Checoslováquia. Não esperava ficar fora até a final da Copa, mas fiquei. Nessa foto estou na arquibancada torcendo porque, como não estava inscrito, não podia ficar no banco. Mesmo com o carinho dos torcedores chilenos, eu tinha a certeza de que, se estivesse jogando, não sofreria tanto. Mas, graças a Deus, fomos campeões, então compensou tudo, né? A compensação foi melhor ainda porque a alegria foi para todos os jogadores e toda a nação. Triste mesmo foi quatro anos depois.”

INGLATERRA, 1966

GUIA DA COPA - PELE 06
GUIA DA COPA – PELE 06 VEJA

“Chegamos à Inglaterra em clima de ‘já ganhou’. A preparação foi uma loucura, montaram três times com reservas e tudo, toda hora a equipe mudava. Uma seleção bicampeã não precisava de tantos testes.”

GUIA DA COPA - PELE 07
GUIA DA COPA – PELE 07 VEJA

“Aqui eu apareço treinando no gol, como sempre gostei de fazer, e lembro que nos dias de preparação nós, os jogadores, conversávamos sobre a importância, em termos de moral, de ganhar a Copa no país onde o futebol nasceu. Infelizmente perdemos para Portugal, eu me contundi no meio do jogo e só continuei em campo porque não havia substituição. No avião comecei a orar e decidi me despedir da seleção. Eu tinha jogado três Copas e sido campeão em duas. Pensei: ‘Está bom, né?’. Aquela foi pesada para caramba. A contusão era séria, nos ligamentos do joelho direito, e fiquei seis meses sem jogar no Santos. Nunca tinha ficado tanto tempo fora. Mas aí fiquei bom, o time começou a ir bem em 1968, 69, e veio a cosquinha: e se eu jogasse só mais uma?”

GUIA DA COPA - PELE 09
GUIA DA COPA – PELE 09 VEJA

MÉXICO, 1970

“Eu fiz mais de 1 000 gols, e as pessoas adoram lembrar gols que eu não fiz. Não é justo! Esse do drible no Mazurkiewicz contra o Uruguai é um dos mais famosos, pena que não saiu o gol. O que impressiona todo mundo, eu acho, é a rapidez do raciocínio. Ele vinha para me fazer foul, me agarrar, então eu larguei a bola e saí dele. No momento dessa foto ele tenta voltar para o gol, e foi por isso que me precipitei um pouco: eu ainda tinha um segundinho ali para bater certo, mas achei que ele ia chegar e por isso toquei rápido, e errei. Quase bateu na trave.”

GUIA DA COPA - PELE 08
GUIA DA COPA – PELE 08 VEJA

“Esse gesto que ficou famoso, do soco no ar, aqui em nossa estreia na Copa, contra a Checoslováquia, que vencemos por 4 a 1, eu já vinha fazendo desde o tempo do Santos e surgiu de modo espontâneo, como um desabafo. Eu nunca tinha visto ninguém fazer aquilo. Depois disso, muitos outros jogadores passaram a dar socos no ar e alguns começaram a inventar, a mudar um pouco, dar de baixo para cima, para não dizerem que estavam me imitando. Acabou virando uma marca minha, principalmente por causa do sucesso dessa foto, mais ou menos como aconteceu com a bicicleta por causa de uma foto tirada no Maracanã. A diferença é que a bicicleta, todo mundo sabe, era coisa do Leônidas, e o soco é meu mesmo.”

GUIA DA COPA - PELE 10
GUIA DA COPA – PELE 10 VEJA

MÉXICO, 1970

“O Pelé tinha uma impulsão danada, rapaz. Subia para caramba. O beque esticava a mão e não alcançava, o goleiro também não. Esse gol na final de 1970 contra a Itália é um dos que mostram isso. Seu Dondinho, meu pai, era um expert no assunto: o recorde dele de cinco gols de cabeça num jogo o Pelé nunca bateu. Ele me ensinou a subir, a dar um segundo impulso quando o corpo está lá em cima, e também a não fechar os olhos. Em todas as comparações que fazem do Pelé com outros jogadores, Maradona, Messi, Zidane, Cruyff, sempre existe uma coisa ou outra que dá para diferenciar. A impulsão é uma delas.”

GUIA DA COPA - PELE 11
GUIA DA COPA – PELE 11 VEJA

“Aqui os mexicanos me deixam só de calção, depois que recebemos a taça e fomos dar a volta olímpica. Isso era comum. Não havia alambrados, e nas filmagens que existem do Santos em torneios na Espanha ou na Itália, por exemplo, acaba o jogo e todo mundo entra em campo. Aquele foi o grande presente de Deus, e agradeço até hoje ter decidido encerrar ali minha carreira na seleção. Tinha ensaiado em 1966, mas daquela maneira, ganhando a Copa e sendo considerado o melhor jogador, foi como o meu pai dizia: ‘Quando for parar, que seja no melhor momento, porque senão logo vão te pôr para fora’. Parar ali foi a melhor coisa que aconteceu na minha vida.”

Texto originalmente publicado em 11/6/2014 no Guia da Copa 2014

https://youtube.com/watch?v=3UQiSUWVfAw%3Frel%3D0

Foi o maior goleador de todos os tempos

Se todas as conquistas, marcas e lances incomparáveis não fossem suficientes para provar que Pelé foi o melhor de todos, restaria resolver a questão apresentando os números de Pelé no quesito mais essencial ao futebol: o gol. Em 1.363 jogos disputados, são 1.281 tentos anotados – uma média fabulosa de 0,93 gol por jogo. O milésimo veio em 1969, de pênalti, no Maracanã. Antes e depois desse marco, porém, Pelé fez gols de todas as formas possíveis e imagináveis. Chegou a marcar oito num só jogo. É altamente improvável que alguém consiga igualar o rei.

No vídeo acima: coletânea de gols de Pelé

https://youtube.com/watch?v=MBglCIs7mqc%3Frel%3D0

É o único tricampeão de Copa do Mundo

No futebol, muitas competições são importantes, mas nenhuma sequer chega aos pés da Copa do Mundo. E nesse palco, onde só os maiores conseguem brilhar, nenhuma estrela é tão forte quanto Pelé. Vários craques conseguiram a invejável marca de duas Copas conquistadas, mas o rei é o único jogador três vezes campeão mundial, em  1958, 1962 e 1970. No total, Pelé foi a quatro Mundiais – só saiu derrotado em 1966, na Inglaterra. Disputou 14 jogos – doze vitórias, um empate e só uma derrota -, e fez doze gols.

No vídeo acima: o rei na Copa de 1970, em que foi eleito o melhor jogador do torneio

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https://youtube.com/watch?v=q-w7VcrqZK0%3Frel%3D0

Ele conquistou todos os títulos que buscou

O currículo glorioso de Pelé só provocou um problema para ele: encontrar espaço para guardar todas as medalhas, placas, taças e troféus que amealhou em toda a sua carreira. Cinco vezes campeão do mundo (três na seleção, duas por clube), duas vezes campeão continental, seis vezes campeão nacional (cinco no Brasil, uma nos EUA) e dez vezes campeão estadual, o rei do futebol é o grande papão de títulos da história da modalidade. De quebra, ainda foi Bola de Ouro da Copa de 70 e Atleta do Século eleito pela Fifa. Levou até a Ordem do Império Britânico.

No vídeo acima: cenas da final da Copa Libertadores, entre Santos e Boca Juniors, na Argentina

https://youtube.com/watch?v=oO6l88n6kig%3Frel%3D0

Era perfeito em todos os quesitos do jogo

A história do futebol é cheia de craques espetaculares, que ficaram famosos por transformar em arte alguns dos fundamentos da modalidade. Garrincha e Maradona eram os magos do drible; Rivellino e Puskas, os chutes-canhão; Ronaldo e Romário, os mestres das finalizações; Franz Beckenbauer, o marcador implacável. Pelé, no entanto, foi um fenômeno único – afinal, reunia todas as qualidades possíveis num jogador. Era fortíssimo, rápido, ágil, tinha inteligência e visão de jogo; exímio cabeceador, chutava forte com as duas pernas. Até de goleiro jogou. Perfeito.

No vídeo acima: dribles e gols variados de Pelé

https://youtube.com/watch?v=ZJBxyJVK1I0%3Frel%3D0

Tinha torcida de todos os times, até rivais

Nas décadas de 1960 e 1970, o torcedor brasileiro tinha um costume que pode parecer impensável para os atuais frequentadores de estádios – além de assistir às partidas de seu próprio time, ele também pagava ingresso para ver os jogos do Santos, com o objetivo único de ver Pelé com os próprios olhos. Pode parecer algo sofrido para torcedores de times como o Corinthians (talvez a vítima favorita do rei) ou o São Paulo (contra quem ele quase sempre marcava lindos gols). Mas compensava: com o maior de todos em ação, a torcida virava Pelé Futebol Clube.

No vídeo acima: gols marcados contra o Corinthians, de quem era o grande carrasco

https://youtube.com/watch?v=nNc-YiUzi2g%3Frel%3D0

Até os gols que não marcou são famosos

É comum criar exceções para as pessoas que fogem aos padrões comuns. É justamente isso que acontece quando alguém começa a montar uma lista dos gols mais bonitos da história do futebol. Entre lances antológicos de gênios como Maradona, Cruyff e Puskas, costuma haver um espaço também para alguns dos gols que Pelé não conseguiu marcar. Nada mais justo: são lances tão inesquecíveis quanto alguns dos tentos mais importantes da história. Os dois melhores são da Copa de 1970: o drible no goleiro sem tocar a bola e a bomba da linha do meio-campo.

No vídeo acima: os “quase gols” mais famosos da Copa de 1970

https://youtube.com/watch?v=0g7TSlkY1xc%3Frel%3D0

Fez do Brasil campeão do mundo aos 17

Traumatizada pelas derrotas nos Mundiais de 1950 e 1954, a seleção brasileira chegou à Copa de 1958, na Suécia, com um time talentoso e bem treinado. A equipe só deslanchou de vez, porém, no terceiro jogo, contra a temida União Soviética. Reservas nas duas primeiras partidas, Pelé e Garrincha foram escalados como titulares no duelo com os russos. Eram as peças que faltavam para transformar a equipe na melhor do mundo. Pelé teve atuação decisiva – fez o único gol da vitória contra País de Gales e marcou cinco gols na semifinal e na final. Tinha 17 anos.

No vídeo acima: lances da conquista da Copa na Suécia

https://youtube.com/watch?v=OS3dihyxr70%3Frel%3D0

Foi o 1º fenômeno do marketing esportivo

Os craques da atualidade, como Messi, Cristiano Ronaldo e Kaká, conseguem dezenas de milhões de dólares por contratos publicitários que espalham seus rostos por todas as partes do mundo. Mas Pelé foi o grande precursor desse filão, emprestando seu sorriso de vencedor e sua imagem de superastro aos produtos mais variados. Talvez variados até demais – ele topava vender quase tudo, de balas Dulcora ao Biotônico Fontoura, passando, é claro, pelo Café Pelé. Aposentado, fez propaganda de Viagra – mas seguiu rejeitando anúncios de cigarros e bebidas.

No vídeo acima: propaganda para a Pepsi, em 1981

https://youtube.com/watch?v=AI_K72kISrY%3Frel%3D0

Plantou a semente do “soccer” americano

Já na reta final da carreira, Pelé aceitou encarar um desafio complicado: popularizar a modalidade esportiva mais praticada no mundo entre os habitantes da nação mais rica e poderosa do planeta. Antes da passagem do rei do futebol pelo Cosmos de Nova York, o soccer era um ilustre desconhecido nos EUA. Como sempre, Pelé conquistou legiões de fãs, encheu estádios e mostrou sua arte na primeira liga profissional dos americanos. Hoje, os EUA têm um campeonato lucrativo e uma seleção competitiva – e muitos atribuem isso à aventura de Pelé na América.

No vídeo acima: lances de Pelé no Cosmos

https://youtube.com/watch?v=TE7VTdXkA6o%3Frel%3D0

Foi capaz de parar uma guerra na África

A admiração pelo astro brasileiro se espalhou por todos os continentes. Não havia internet e as transmissões televisivas ainda engatinhavam. Ainda assim, o fascínio pela imagem de Pelé tornou-se tão grande que até inimigos mortais entravam em acordo quando se falava no nome dele. Em 1967, Pelé esteve na Nigéria para disputar alguns amistosos pelo Santos. Os guerrilheiros nigerianos e as tropas do ditador que detinha o poder na ocasião selaram um armistício de 48 horas, cujo único objetivo era liberar todos para ver Pelé jogar. E assim aconteceu.

No vídeo acima: guerra também foi o tema de um filme de que Pelé participou em 1982: Fuga para a Vitória, com Sylvester Stallone e Michael Caine.

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